LUA

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

150 contas na mira da polícia


O Ministério Público e a Polícia Judiciária não receberam a informação bancária requerida às autoridades inglesas, no âmbito da investigação ao caso Freeport. É essa a carta rogatória que ainda não foi cumprida, impossibilitando que a investigação no nosso país seja acelerada.

O CM sabe ainda que foi pedida informação de 150 contas, muitas delas sediadas em offshores ingleses. As autoridades tentam então reconstituir o rasto do dinheiro, de forma a perceber se houve efectivamente pagamentos de ‘luvas’ e a quem elas se destinavam.

Por as contas não serem portuguesas, a investigação viveu um impasse nos últimos quatro anos. Trata-se de elementos considerados fundamentais para que a PJ e o Ministério Público possam inquirir os suspeitos, constituindo-os formalmente arguidos (o que ainda não aconteceu).

Cândida Almeida, directora do DCIAP, já tinha dito que a falta de resposta inglesa tinha comprometido as investigações, tendo mesmo afirmado, nas entrevistas televisivas da semana passada, que havia um pedido que não tinha obtido resposta por parte das autoridades inglesas.

Refira-se, ainda, que este comportamento da polícia inglesa – que não forneceu informação bancária – está longe de ser inédito. No âmbito das cooperações europeias, o Reino Unido é o país que apresenta sempre maiores resistências a prestar informação. Por não haver prazos para responder às rogatórias, as mesmas podem ficar pendentes vários anos.

Há diversos processos, como por exemplo o caso que envolve comissões na transferência de João Pinto do Benfica para o Sporting – e que tem como arguido José Veiga –, que também está parado por falta de resposta dos ingleses. Outro exemplo foi o caso dos barcos da Expo, cuja informação bancária demorou vários anos a ser recebida pelas autoridades do nosso país.

IMPOSTO BLACKOUT

Depois da avalanche noticiosa dos últimos dias, Pinto Monteiro impôs um blackout informativo aos magistrados relativo ao caso Freeport. O objectivo é evitar qualquer fuga de informação, numa altura em que o MP foi fortemente atacado pela possibilidade de ter sido a fonte de alguns elementos que foram tornados públicos.

Ainda segundo o CM apurou, a mesma determinação existe na Polícia Judiciária. Dada a sensibilidade do tema – que volta à ribalta em ano eleitoral, envolvendo directamente o actual primeiro-ministro e candidato anunciado às próximas eleições legislativas –, também a informação do processo circula por um número reduzido de pessoas, de forma a evitar qualquer conhecimento público.

MÁ IMAGEM DO MINISTÉRIO PÚBLICO

O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) afirmou ontem, no Parlamento, que 'já foram produzidos demasiados danos na imagem do Ministério Público' e recusou-se a fazer qualquer comentário sobre o caso Freeport, porque 'há demasiado ruído'.

'Não queremos acrescentar ruído ao ruído', justificou António Cluny, acrescentando que quando o SMMP tiver que se pronunciar sobre o caso será primeiro por 'via institucional' e 'nunca publicamente'.

O presidente do SMMP lembrou que 'já foram produzidos demasiados danos na imagem do Ministério Público (MP)', pelo que haverá 'todo o cuidado e reserva a tratar dessa matéria'.

O magistrado não quis também comentar uma proposta discutida terça-feira em sessão do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), para se averiguar as diligências feitas pelo MP no âmbito da investigação ao caso Freeport, relacionado com o licenciamento do outlet de Alcochete a três dias das eleições Legislativas de 2002, quando era ministro do Ambiente o actual primeiro-ministro, José Sócrates.

Cluny falava aos jornalistas no final de uma reunião com o Grupo Parlamentar do PSD para abordar as alterações ao Estatuto do MP, que, para o presidente do SMMP, é uma 'questão muito importante'.

AGÊNCIA QUE COMBATE FRAUDES

O Serious Fraud Office – a agência policial britânica de combate a grandes fraudes e que assinou a carta rogatória que envolvia José Sócrates e que foi recentemente enviada para Portugal – depende directamente do primeiro-ministro daquele país. Por ser uma entidade passível de pressão política, a hipótese de equipa mista foi recusada. É também por esse motivo que as autoridades inglesas mostram reserva em passar informação sobre o caso.

DISCURSO DIRECTO

'ADVOGADO É A ÚNICA SOLUÇÃO SÉRIA' (Rodrigo Santiago, Advogado penalista)

Correio da Manhã – Concorda com a proposta do advogado João Correia, que sugeriu uma sindicância à investigação do Freeport?

Rodrigo Santiago – Tudo o que for fiscalizar o Ministério Público é sempre bom. Se o Ministério Público souber que pode ser controlado a todo o momento, talvez melhore a sua maneira de actuar.

– Mas já existem inspecções ao Ministério Público.

– Inspecções feitas por procuradores... É evidente que não funcionam. Um dos males do Ministério Público é o compadrio nas inspecções.

– Então, neste caso também não concorda que seja um procurador, membro do Conselho Superior, a fazer a sindicância à investigação.

– Se tiverem coragem, entreguem a sindicância a um advogado porque nós não temos carreira e não dependemos do Estado. Solicitem à Ordem dos Advogados que nomeie um advogado. É a única solução séria.

PROTECÇÃO CIVIL INSTAURA PROCESSOS

Alcino Marques, responsável pelo Comando Distrital Operacional de Setúbal da Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) terá, em 2004, negociado a possibilidade de ser consultor do Freeport, dias antes de fiscalizar e aprovar o plano de segurança contra incêndios. Na sequência desta notícia, divulgada pelo ‘24 horas’, o presidente da Autoridade Nacional de Protecção Civil, Arnaldo Cruz, decidiu 'instaurar um processo de averiguações, para apurar da veracidade da alegada colaboração técnica'.

PORMENORES

EQUIPA MISTA

As autoridades portuguesas recusaram a possibilidade de fazer uma equipa mista para investigar o caso Freeport.

CARTA ROGATÓRIA

Os ingleses pediram na carta rogatória que fossem fornecidos diversos elementos relativos à investigação, tendo afirmado que José Sócrates era um dos suspeitos.

QUANTIAS

O valor das alegadas ‘luvas’ para o licenciamento do outlet de Alcochete não está determinado. Poderá rondar entre os quatro e os cinco milhões.

INGLATERRA

A maioria das offshores, para onde terá sido desviado o dinheiro, tem sede em Inglaterra

NOTAS

ATAQUE: CORREIA DE CAMPOS

O ex-ministro da Saúde, Correia de Campos, considerou ontem que o caso Freeport foi criado pela Comunicação Social, que assumiu o papel da Oposição por esta ser 'fraca'

COIMBRA: CARLOS ENCARNAÇÃO

O edil de Coimbra, Carlos Encarnação, considerou que 'o Governo está em perigo' depois de o primeiro-ministro ter alegadamente 'ignorado' o papel da Justiça na sociedade

MÁ IMPRENSA: MIRA AMARAL

'Não há nenhuma acusação, não aceito que sejam postas em causa as competências de um Governo com base em artigos de imprensa', disse o ex-ministro da Indústria, Mira Amaral.


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