O eventual uso de um tóxico, designado "cavalinha", no caso da cegueira de seis doentes no Hospital Santa Maria, Lisboa, está a ser investigado pela PJ. As análises para pesquisar possível troca de fármacos serão feitas em Inglaterra.
De acordo com informações recolhidas pelo JN, a suspeita de utilização daquela substância, tida como resina tóxica, foi aventada através de um telefonema anónimo recebido naquela unidade hospitalar a 25 de Julho. A Polícia Judiciária (PJ) já apurou que a chamada foi efectuada a partir dos arredores de Lisboa.
Esta é uma das hipóteses de troca de substâncias que estão a ser averiguadas na investigação conduzida pelo DIAP do Ministério Público de Lisboa com a PJ, Infarmed, Instituto Nacional de Medicina Legal e Inspecção-Geral de Saúde, que deverá ter, agora, a colaboração da Agência do Medicamento do Reino Unido.
A intervenção desta entidade estrangeira vem na sequência de uma das conclusões do relatório do Infarmed: elevado risco de troca no medicamento (Avastin) que deveria ter sido administrado àqueles seis pacientes. Há outros quatro fármacos levantados como probabilidade de troca, dada a prática detectada nos serviços farmacêuticos do hospital.
Sucede, porém, que em Portugal não existe tecnologia capaz de pesquisar a presença daqueles medicamentos, já identificados, nas amostras de líquidos oculares (humor vítreo). Por essa razão, por proposta do Infarmed, o Ministério Público autorizou o pedido de colaboração a Inglaterra.
Ainda segundo o que apurou o JN, a ter ocorrido esta hipótese levantada pelo Infarmed, tal poderá ter sido motivado por erro, não intencional, possivelmente na unidade de preparação dos medicamentos, eventualmente porque naquele local são manuseados mais do que um medicamento e são, também, guardadas em frigoríficos embalagens algo parecidas. Um relatório da Inspecção-Geral das Actividades em Saúde sustenta esta hipótese.
Já no caso de a troca ter sido intencional - eventualmente, segundo a denúncia anónima, com uma resina conhecida como "cavalinha", usada na medicina como diurético e possuindo características tóxicas para o globo ocular -, ela pode ter acontecido em qualquer fase do circuito de circulação do medicamento até à aplicação nos pacientes.
Os relatórios já concluídos dão como certo não existirem indícios de uso de Avastin, apesar de o lote administrado aos doentes conter aquele medicamento.
Outra hipótese levantada pelas investigações é a eventual contaminação com outros dois fármacos, preparados mediante o uso do mesmo tipo de seringas também no serviço de oftalmologia do Hospital Santa Maria.
A concretização do apoio da Agência do Medicamento do Reino Unido é urgente, dada a validade das amostras recolhidas aos seis doentes que ficaram cegos após intervenções no passado dia 17 de Julho.
Por agora, os inspectores da PJ têm inquirido todos os elementos do hospital que possam fornecer informações úteis ao esclarecimento do caso, ao mesmo tempo que é averiguada a credibilidade da denúncia anónima recebida por uma médica. Não há suspeitos, até ao momento. Em causa nesta investigação estão crimes de tratamentos médico-cirúrgicos sob negligência e corrupção em substâncias medicinais, este punível com prisão até oito anos.