A intervenção de Isabel Jonet, presidente do "Banco
Alimentar Contra a Fome", quando co-entrevistada, na "Edição da
Noite", da SIC Notícias de 06-11-2012, foi algo que suscitou incontrolável
«abjecção» e «repugnância». Isabel Jonet deveria ter consciência de que o
protagonismo que vem assumindo se deve, essencialmente, à generosidade dos
doadores que, muito provavelmente, desconhecem a mentalidade «caritativa» e
«salazarenta» que, salvo melhor entendimento, a caracteriza.
Para muitas pessoas, o "Banco Alimentar Contra a
Fome" deixou de merecer a mínima confiança, enquanto entidade
«intermediária» dirigida por essa senhora, e, como tal, não estarão dispostos a
contribuir com mais uma lata de sardinhas para a dita instituição enquanto
Isabel Jonet não se demitir.
Maria Isabel Jonet, trabalha desde 1993 em regime de
voluntariado no Banco Alimentar Contra a Fome, sendo actualmente Presidente da
Federação Portuguesa dos Bancos Alimentares Contra a Fome. Trabalhou no Comité
Económico e Social das Comunidades Europeias, em Bruxelas, entre 1987 e Julho
de 1993. Foi adjunta da Direcção Administrativo-Financeira da Sociedade
Portuguesa de Seguros entre Março de 1983 e Dezembro de 1986 e da Direcção
Financeira da Assurances Général de France em Bruxelas em 1987 (todas elas
ligadas a instituições de crédito - as tais que fabricaram a «Crise
Financeira»).
Caríssima Isabel Jonet,
Gostaríamos de lhe dizer frontalmente, com o mínimo de
mediações, que o nível das suas declarações é aviltante, sobretudo para aqueles
com quem se diz preocupar e em nome dos quais desfruta o brunch da
beneficência. Queremos dizer-lhe, antes de lhe devolver cada um dos insultos
para citar nas vernissages, que o movimento que lhe escreve luta sobretudo para
que ninguém se habitue ao empobrecimento. O nosso combate, todos os dias, é
pelo pleno emprego e pela justa distribuição do trabalho, única via que
identificamos para não ter que contar com o seu negócio a cada vez que falta
capital ao mês. Fala-lhe um grupo de pessoas, jovens e menos jovens, desempregados,
precários, sub-empregados, gente que se empenha quotidianamente para derrotar
quem, como a senhora e a Merkel, insiste em mascarar de caridade o saque que
estão a fazer às nossas vidas.
Sabemos que preside à Federação Europeia dos Bancos Alimentares
Contra a Fome, posição que ocupa desde Maio de 2012, e que a sua influência
aumenta na proporção da miséria nos vai impondo. Sabemos que é rica e
privilegiada e nunca falou da fome com a boca vazia. Sabemos que sabe que não
falta miséria para alimentar de matéria-prima a sua fábrica. Sabemos que olha
para os pobres com desdenho, nojo, pena. Sabemos que na hora de fazer a
contabilidade aquilo que a move é a sua canja, o seu ceviche, não o caldo dos
outros.
Afirma que vamos ter que "reaprender a viver mais
pobres", quando a senhora só sabe o que é viver mais rica, que
"vivíamos muito acima nas nossas possibilidades" quando é sua
excelência que tem vivido às nossas custas, que "há necessidade permanente
de consumo, de necessidade permanente de bens para a satisfação das
pessoas" quando em nenhum momento da sua vida a falta de verba lhe deu
tempo para ganhar água na boca. Atira-nos à cara, com a lata da Chanceler, que
os seus filhos "lavam os dentes com a torneira a correr" e que se nós
"não temos dinheiro para comer bifes todos os dias, não podemos comer
bifes todos os dias", quando cada vez mais o problema das pessoas é ter
casa onde os filhos possam lavar os dentes e onde os bifes nunca ganharam a
tradição dos que são fritos no conforto das Arcádias. Em tempos sombrios,
poucos provaram o lombinho do seu talho predilecto, aquele que sempre visita
com generosidade, antes dos fins-de-semana que costuma fazer com requinte, no
crepúsculo alentejano.
Deixe-nos explicar que enquanto pensava que à sua volta
"estava tudo garantido, alguém havia de pagar", éramos nós, os nossos
pais e avós, que lhe aviavam a mesada. Perceba que a cada momento em que delira
com a cegueira de que "cá em Portugal podemos estar mais pobres, mas não
há miséria", abastece-se à confiança do nosso fiado e das nossas dores de
barriga. Entenda, que o tamanho dos seus disparates não abafa os murmúrios da
pobreza e a miséria. Deixe-nos dizer que um milhão e meio de desempregados, com
a fome e a subnutrição visível das urgências dos hospitais às cantinas das
escolas públicas, a cólera já sobra às páginas dos jornais do dia. Deixe-nos
dizer-lhe que o tempo não é de substituir o "Estado Social" pelo
"Estado de Caridade", mas de pelo menos ter tanto cuidado com os
pobres como com aquilo que se diz.
Pode caluniar os nossos pais, que nem o histerismo fútil com
que os brinda não a torna capaz de encontrar exemplo de quem troque a bucha
pela ida ao Super-Rock. Pode gritar, sem sequer dar ao luxo do fôlego, que eles
"não souberam educar os filhos", que a cada desabafo nos permite
desvendar um pouco mais o véu das suas intenções, da origem do seu soldo.
O seu mundo, caríssima Jonet, é um decalque da propaganda do
Governo, um corpo torpe atirado à máfia de capatazes e dos carcereiros, aqueles
que lhes têm ajudado a arranjar mais e mais margem de lucro no plano financeiro
da sua pérfida empresa.
O mundo de Jonet é o mundo da classe dominante, do
privilégio, da riqueza, do poder desmesurado, dos estereótipos que ajudam a
lavar o sangue que lhe escorre das unhas. No mundo de Jonet, as PPPs, os
submarinos, a exploração, o assalto dos governantes, são propaganda subversiva
ao serviço de gente acomodada, inútil, descartável. No mundo de Jonet "não
existe miséria" como "em Portugal", não é assim? Em suma, no
mundo de Jonet não se vive o que é preciso para se ganhar um pingo de vergonha.
Se estiver disponível, teríamos todo o gosto em entregar-lhe
esta carta em mãos.
Sem cordialidade mas com muito mais educação,
Seus detractores,
O Movimento Sem Emprego & sopinha para o jantar.